domingo, 24 de março de 2013

O porquinho Manivela!


Lá pelos anos 50 um toró de água caiu sobre a cidade de Rio Grande e é nessa circunstância  que esta crônica começa. 


Naquela ocasião o pequeno Edison tinha cerca de oito para nove anos e morava com sua família em uma modesta casa num bairro pobre da cidade. A chuva que caiu por três dias ininterruptos alagou a cidade e transformou as ruas em corredeiras que transportavam todo o tipo de coisa: geladeiras, armários, pedaços de telhado, quadros e animais! 

Eis que o pequeno Edison, da janela da cozinha, olhava aquele aguaceiro todo descendo a rua quando avistou, vindo lá longe, boiando, quase se afogando, um porco, ainda filhotinho, preto e com o rabinho que mais parecia uma hélice impulsionando-o corredeira abaixo. Edison não pestanejou: pegou a panela da mãe, inclinou-se pela janela, prendendo os pés no fogão à lenha, e, num movimento rápido, “empanelou” o porquinho, trazendo-o para os seus braços. Teve que tratar o pequeno, pois estava muito debilitado e quem saberia por quantas horas ele já não estava na água. Com um pouco de farinha e água fez um alimento e deu para o bichinho comer. Logo, logo recuperou-se e passou a entreter os moradores da casa, que o apelidaram de Manivela, pois o seu rabinho quebrou na enchente, ficando parecido com uma manivela daquelas bem peculiares. 



Em poucas semanas o Manivela estava grande e era motivo de alegria na residência, pois o pequeno Edison havia lhe ensinado até mesmo alguns truques, ocupando o seu horário após auxiliar a mãe nas lidas da casa. Com o passar do tempo o porquinho – agora um porcão – foi colocado num chiqueiro nos fundos do terreno e era alimentado com as sobras de alimentos e mais alguns legumes perecidos de uma fruteira lá do centro da cidade. Mas a crise fungava forte no pescoço de todos e para aquela família pobre, cem quilos de carne significava muito. E eis que num triste e emocionado consenso optaram por transformar o Manivela em alimento. 

A mãe encarregou-se da receita: faria o pernil numa forma levada ao forno, acompanhado por vinho branco, alhos em casca – pois adocicaria o sabor do alho –, batatas com casca cortadas pela metade, sal e pimenta, cebolas inteiras e um pouco de banha derretida para ir pincelando no pernil. Um banquete! E no jantar, memorável jantar, diga-se de passagem, a família reuniu-se em torno da mesa misturando a fome com a tristeza e, entre uma e outra garfada de arroz, com carne pingada de lágrimas, choravam e murmuravam de boca cheia: – Manivela!!!!!!!!


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